quinta-feira, 3 de outubro de 2013

No reino da Morgana

Quantas noites em claro são necessárias pra admitir a necessidade que temos de alguma coisa? No meu caso, muitas. Na verdade, anos de noites em claro, me perguntando se o que eu sentia era fruto da minha imaginação, e das minhas lembranças, ou se era realmente algo inerente à minha natureza, do qual eu nunca iria conseguir fugir...

Minha primeira experiência com dominação aconteceu bem cedo, e escolher de que lado do chicote eu queria estar, foi por acaso. Meu namorado à época pediu pra amarrar as minhas mãos, a título de dar uma apimentada na relação. Eu, que tenho uma personalidade forte, perspicaz, controladora e autoritária, por natureza, ingenuamente cedi a esse pedido... Foram os minutos mais longos da minha vida, e uma agonia que parecia infinita tomou conta de mim. Estar ali, frágil, submissa às vontades de outra pessoa, que me comandava, que ditava meu ritmo, foi, pra mim, um sofrimento. "Não gostei, me solta", foram as únicas palavras que eu consegui falar. Mas senti uma vontade quase irresistível de fazer o inverso, prender as mãos dele, comandar, e fiz a proposta...

No momento em que me vi amarrando suas mãos na cabeceira da cama, eu percebi que era aquilo que eu queria fazer, desde sempre. Era aquela relação de poder que me excitava, era a vulnerabilidade do outro, era comandar com os olhos que fazia meu coração bater muito, mas muito mais forte. Não me parecia estranho, errado, nem nenhum desses adjetivos que a gente vê por aí, quando se trata de BDSM (o famoso acrônimo para Bondage/Disciplina - Dominação/Submissão - Sadismo/Masoquismo). Parecia eu. E ERA eu.

Me descobrir sádica foi um pouco mais complicado... Por mais que eu tenha uma cabeça aberta, livre de preconceitos, de rótulos e convenções, perceber que infringir dor à alguém te dá prazer, pode ser de pirar em alguns momentos. Explorar o limite, a degradação e as misérias de outra pessoa pode parecer realmente doentio, e pra não ultrapassar a barreira entre o prazeroso e o patológico, eu comecei a criar as minhas próprias regras. Isso moldou muito a Domme que sou hoje, e, parafraseando uma pessoa que caiu de pára-quedas na minha vida pra fazê-la girar 180º, me tornou "lúdica".

Bom, mas antes, muito antes dessa pessoa surgir, eu me casei. Há quase dezesseis anos atrás... Meu casamento foi um divisor de águas na minha vida. Eu queria ser mãe, eu queria sossegar, eu queria poder repousar meu coração inquieto e a minha cabeça, atormentada, no colo de alguém. E naquele momento, eu aprendi uma coisa que jamais havia feito na vida: CONCESSÕES. É extremamente complicado, doloroso até, pra alguém acostumado a comandar, abrir mão dessa sensação de poder. Mas eu abri, em nome de tudo o que eu mais queria na vida, e aprendi a ser feliz, mesmo que a felicidade tivesse sabor de baunilha ;)


Sempre fui insone, noturna, e durante todos os anos do meu casamento, de vez em quando, eu arriscava deixar a loba colocar um pouco as unhas de fora, e ia bater papo na internet. Algumas noites me divertia, outras me frustrava, numas achava graça e em outras eu tinha nojo... Achava que ou eu tinha virado baunilha de vez ou a galera tava muito pirada, e não gostava daquilo. E sempre pulava fora. Até que um belo dia, encontro no chat um "menino", dez anos mais novo que eu, com o nome de SubNovo27. Ele me deu boa noite, e engrenamos um papo muuuuuuuito bacana, que explicitava que nós dois tínhamos tanta coisa em comum que valia a pena dar uma esticada pro skype e continuar o papo.


Mal sabia eu que mais madrugadas insones estariam por vir. O que ele tinha que depois de tantos anos, eu já pensava de novo (e de novo, e de novo...) em dominar alguém? Que tipo de consequencia isso ia trazer pra minha vida, porque eu jamais havia dominado alguém com quem eu não tinha intimidade sexual. Dúvidas, tantas, que parecia que eu nunca tinha feito isso, mas ele conseguiu me fazer ultrapassar uma por uma, até tomar a decisão de que se ele queria ser dominado por mim, eu iria dominá-lo.

Dominação, pra mim, não é unilateral. Leio fóruns, vejo blogs, e, quase numa totalidade absurda, vejo dominadores tratando seus submissos como lixo. Dominadores que dizem que se quisessem realizar desejos de alguém seriam submissos... Acho isso triste, e absurdo, porque pra mim, o submisso é alguém que tem que ser cuidado. Ainda ontem falei com ele sobre isso, e afirmei a minha convicção de que o submisso gosta mais da ideia de estar sendo castigado do que da dor em si, e isso ainda é um assunto delicado entre nós... Ele é, segundo sua própria definição, "soft", e eu, "hard", mas ainda temos que aprender a andar antes de correr nessa estrada (ele odeia essa frase que eu vivo repetindo!!). O submisso tolera pela fantasia, aguenta pelo desejo de satisfazer. É uma entrega linda. O olhar de medo, de menino assustado, o corpo vermelho, e a obediência depois, compõem uma cena maravilhosa, que só quem é dominador, entende o que eu tô falando.

Muito provavelmente, só ele e eu iremos ler esse blog. Estamos nos descobrindo, amadurecendo a ideia, e eu, desempenhando o papel mais importante dentro dessa nossa história, que é conquistar a confiança dele. Sinto uma necessidade real e verdadeira dessa entrega, que é uma troca, e eu quero muito fazer valer a pena.

Pra você, D. Com carinho e umas boas palmadas na bunda,

Morgana


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